15.10.15

Os novos reacionários

A internet intensificou algumas relações pautadas na facilidade de expor sentimentos em relação ao outro, facilitou também a atribuição de títulos ao outro, é muito fácil hoje chamar alguém de nazista, fascista e reacionário, ou apontar o outro como esquerda ou direita baseado em poucas escolhas, mas ninguém se preocupa em analisar o que de fato estas palavras definem, e quais implicações estão contidas nestas definições imediatas e levianas, por mais que alguém tenha cometido um ato de preconceito isto é suficiente para chamá-lo de nazista? Desconsideramos todas as possibilidades que o levam a pensar assim, não como ideal, mas talvez como má formação intelectual, familiar/educacional.
            Comecei a ouvir de uns tempos pra cá um “apelido” que na verdade ainda não identifiquei ao certo bem para quem é proferido, nem sei de sua origem, mas por me parecer um título um tanto tosco, uma forma barata de estigmatizar alguém, confesso que não me ocorre de averiguar, porém quando chamam alguém de coxinha eu só consigo pensar como “coxinha” quem usa um termo deste, a meu ver um termo que nasceu brega.
            Reacionário é outro termo que no Brasil atual não se usa corretamente, ele não tem o mesmo valor de quando Nelson Rodrigues se chamava reacionário, hoje ele é usado para baratear qualquer discurso por alguns que possuem ideal calcado na velha esquerda, mas não chega a definir muita coisa, fica parecendo um “coxinha old school”. Segundo o dicionário, reacionário é aquele que está totalmente contrario as transformações da sociedade, é uma espécie de depreciação do termo conservador, porém a maneira que se tem usado é tão somente para carregar de contrariedade sobre determinado assunto (assunto na grande parte, desconexo) de um emissor que vê em tal ponto um problema.
            De certa forma o conservador passa por uma crise, a meu ver ele se assemelha muito aos grupos de defesas das minorias, já que em grande parte este conservador é um militante dos valores da religião cristã, sendo que todos eles, incluindo os grupos que defendem bandeiras raciais e de gêneros se assemelham por colocarem valores sobre segmentos acima da sociedade como um todo.
            A ideologia é uma forma de dominação mental capaz de agir sob os maiores absurdos, onde todos os valores são substituídos por um considerado maior com poder de anulação da razão.
            Levantar bandeira é um ato de preconceito e desrespeito ao outro, pois é simbolicamente cravar num território de todos aquilo que lhe pertence, desta forma, numa sociedade de iguais (que se almeja e sob o que diz a constituição do país) estes grupos de ativistas ao cravarem o desejo de uma lei particular ao gênero definido por eles, incabíveis num âmbito de iguais em espécie, igualam-se a todo histórico da religião católico-romana, quando, por exemplo, sob um símbolo em bandeira realizavam as cruzadas, ou mesmo os jesuítas catequizadores de índios.
            Se tomamos como exemplo as cotas raciais, as soluções sociais que o Estado deve tomar (que seriam as cotas da escola publica ou econômicas) acabam substituídas pela eterna mantenedora de corrupção que irá julgar pela cor da pele de alguém seu lugar especial entre todos, segmentando-o diante de algo que diz que todos são iguais e possuem o mesmo direito independente de cor, crença...
            No bolsa família, por exemplo, num país deficiente como o Brasil, não é errado este tipo de assistência, errado é o modo que ele se dá, pois o mesmo deve ter um tempo e não deve ser eterno, esta família que recebe o auxilio, tem que ser levada a ter obrigatoriamente um filho na universidade e com boas notas, e não ser levada a “inventar” um novo filho sempre que o outro se emancipa, para assim levianamente promover a eternidade de um mecanismo deficiente.
            Não ocorrem muitas discussões de amplitude honesta na política nacional, justamente por haver uma polarização de ideais de esquerda e direita, onde as fórmulas apresentadas sempre beiram aos extremismos que geralmente não servem para o país.
            Ao invés de agir ideologicamente, deveríamos usar o pensamento metódico e conceitual para apresentar questionamento, isto sim é um ato social; é comum vermos campanhas desenfreadas nas redes sociais, baseadas tão somente na desmoralização, na mentira e na opinião, é comum aos militantes petistas, por exemplo, usarem somente a depreciação ao PSDB, porém estes não se assumem militantes quando assim são taxados, e seria muito mais honesto se assim o fizessem, assumir-se como tal e que sua opção é puramente ideológica, já que com argumentos práticos ficam impossibilitados de agir, partindo assim ao discurso irracional e falacioso. Mas como meu objetivo aqui não é discutir a religião secular da esquerda e principalmente do marxismo, nem dirijo estas palavras a este tipo de fanáticos, mas a pessoas dispostas a refletirem, proponho um exercício filosófico - e, portanto, nenhuma explicação sobre os temas -, quero puxar o gancho apenas de que a importância aqui está na ideia da reflexão política onde a coerência é convincente e não as afirmações que levam ao Verdadeiro ou Falso.
            Muitas vezes a coerência parte de um histórico pessoal, o problema é a falta de identificação desse histórico pela própria pessoa que emite suas conclusões, na maioria não passa de onda, de onda de interesses de grupos específicos onde estes que nela deslizam não pararam para uma autoanálise.
            O que pode ocorrer também é que tal autoanálise seja impossível, Schopenhauer, por exemplo, nos traz na filosofia a questão da intuição, e de fato se esta é uma atividade totalmente presente no homem, como aparenta, muitos são incapazes de interpretarem o que leem, inclusive, a leitura de mundo totalmente arbitraria e fechada num arbítrio inflexível não pode chegar próximo a realidade da coisa, mesmo que ninguém chegue a realidade total da coisa, os inflexíveis muito se distanciam de compreender ao menos uma realidade próxima que possa dar um sentido e uma continuidade ao processo de leitura, compreensão e feitura de um pensamento, seja político ou qualquer outro.
            Voltando ao aspecto ideológico, veremos que estes sintomas são os mesmos que existem em fanáticos religiosos, ainda mais agora em que as religiões são substituídas, não só o marxismo é uma religião secular, como há inúmeras outras; o veganismo, por exemplo, eles tratam os carnívoros assim como o crente trata o pecador, vendo neste uma “alma” ainda possível de obter salvação, da mesma forma que as seitas urbanas, os movimentos de cicloativistas, grupos neohippies onde tudo é lindo, amoroso e mal cheiroso (literalmente); em algumas experiências que tive em eventos onde reuniam-se tais temáticas eu me sentia totalmente como um intruso na seita, como um ateu em meio à fervorosos pentecostais, sendo o único a ver aquilo como algo absolutamente ridículo, já que ao olhar em volta, todos numa cegueira religiosa sorriam um sorriso demente de pertencimento a certa verdade ocasional. Em outro caso onde atitudes recorrentes de centenas de ciclistas trancando ruas e calçadões (estes calçadões exclusivos para pedestres) em nome de um ativismo desrespeitoso à particularidade do outro, em seu direito sob lei de ter um carro, ou quando pedestre – como é o meu caso – na calçada tendo que desviar de ciclistas que em velocidade não tem um mínimo de respeito, inclusive quando tive que desviar bruscamente de uma ciclista que ostentava uma placa em seu veículo com a palavra “RESPEITE”. Percebe-se perfeitamente que estes como seres humanos precisam substituir seu vazio com a militância que sempre deseja um mundo de semelhantes a si.
            Outro fator é a necessidade de pertencimento a grupos, quando este já não obedece a totalidade de meus interesses, então vai-se atrás de outro, sendo uma adaptação da condição social a uma condição humana, já que “no passado tinha-se uma religião desde o nascimento, hoje procura-se uma religião, que pode ser mudada conforme a moda: o divino não é mais formativo, é vagamente performático como um estilo, um vocabulário existencial”.[1]
            Toda insegurança desta geração de velocidade e espontaneidade de redes sociais permitem a facilidade e aproximação do erro, erro das relações e das comunicações, pois não há tempo para pensar. Apresenta-se uma crise do homem consigo, pois “não estão mais satisfeitos com a sua hipnótica auto-referência para separar e ordenar os reinos; ou simplesmente não sabem mais o que são (sic).”[2]
            Fato é que todas estas investigações que de certa forma já foram colocadas no passado de forma um pouco diferente, levando em conta o mundo que se pensava nos séculos XIX e XX, mas que em essência podemos aproveitar, e que eu mesmo já venho suscitando em outros textos, tudo tende a uma progressiva para desencadear em outra “Era”?, no pós-humano, no pós-moderno, no super-homem? Termos que não vem ao caso, pois aqui não venho conjecturar um futuro, mas minhas reflexões pensam o agora, para que finalmente haja um futuro, neste sentido o niilismo é um passo, mas que neste momento não é necessário recorrer, pois já foi explicado exaustivamente noutro momento, agora é o que fazemos sob ele e principalmente nesta defasagem que sofre o país pertencente ao terceiro-mundo que ainda discute soluções arcaicas; os moderninhos, achando-se no auge do humanismo, na verdade estão sendo uns conservadores culturais, uns reacionários da condição humana que já age sob outras formas de se relacionar num âmbito maior e elevado.
            Almejar o pós-capitalismo, este termo tão usado por estes jovens no terceiro-mundo, quando na verdade devemos pensar um capitalismo relacional que caminhe junto aos direitos humanos, e não que faça seu escopo entre ricos e pobres que se cruzam nas ruas, mas sim em um dinheiro não visto e não palpável que move as coisas do Estado e tudo que o cerca, sejam as instituições privadas ou públicas, para isso que devemos discutir justamente a diminuição do estado e sua excessiva burocratização, que é engessamento do progresso material e humano, além de ser um cerceador da liberdade dos indivíduos.

Diego Marcell
29/10/2014

Referencia:
SANTOS, Jair Ferreira. Breve o pós-humano ensaios contemporâneos. Rio de Janeiro/Curitiba: Francisco Alves / Imprensa oficial do Paraná. 2002.




[1] SANTOS. Breve o pós-humano. 2002, p. 38.
[2] Idem, p. 59.

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