27.10.13

Um conto liberal e nada conservador ou As conspirações de um órgão do ser


Dedicado a Nelson Rodrigues, Diogo Mainardi, Lobão e outros contemporâneos
Inspirado após a leitura do conto Misere, Domine de João Manuel Simões

_ E se essa vida não passar de uma teoria da conspiração metafísica?

            Assim pensava o ex-seminarista deitado no sofá de sua kitinete no centro da cidade, já faziam três anos que abandonara o seminário, um antes de se tornar teólogo, iria defender a predestinação em Santo Agostinho, agora, porém, já não sabia.
            Queria se dedicar aos romances e às prostitutas, já que crescera sob a pressão da extrema religiosidade católico-romana, o próprio bispo de Hipona já era uma reivindicação de tudo, mas estranhamente admirava mais o escritor das Confissões antes mesmo do maniqueísmo; pois enquanto o Jesus pré-adolescente ensinava os eruditos na sinagoga, o santo africano roubava laranjas, e isto sim era divertido, ou pelo menos fazia algum sentido, pensava ele.

_ Nunca saberemos por que tantos signos se apossam da linguagem e nos remetem sempre à infinidade do universo que deve esconder algum Deus, mas que provavelmente não vem nos visitar ou no mínimo usar aves como instituição celestial de mensagens. É fato que pode ter alguém brincando com nossa raça e só a nossa, já que os coelhos estão em paz (inclusive com relações aos ativismos animais que só pensam nos cães), mas também não penso que sejam estes Ufos tão concorridos, não seria tão óbvio assim, mas como o óbvio ulula na população, grande parte é atraída por estas bobagens, já a questão religiosa não chega a ser tão óbvia como pensam os ateus, pois nascemos nestes contextos culturais, o trabalho é nos desprendermos disto, nos limparmos, tomarmos a pílula que Orfeu nos oferece e adentrarmos nos bastidores da Matrix, assim como o índio nasceu ouvindo sobre Tupã (ou seja lá quem são seus deuses, no seminário e na escola pública nunca estudamos afundo estas questões territoriais) nós o fizemos com relação ao Cristo, não falo dos fundadores das seitas, isto está muito longe de nossas existências que seguem à contingente morte, seria outro tipo de suposição, essas que eles adoram investigar nestes canais de história e na revista Super (des)Interessante, futilidades para alimentar a minoridade intelectual da sociedade, se não fosse por Kant, por Nietzsche, por Pondé, haveriam de surgir outros, mas importante é conspiração por suposição, prefiro a conspiração silenciosa e cética que pinga na alma do individuo sobre estas conspirações impostas por comunas degenerados pelo poder, mesmo que ainda apenas em potência, prefiro o niilismo de teopossibilidade, já que o niilismo ateu torna tudo fácil de mais e covarde demais.

            Ele remoia essas ideias furtadas em seu escuro e empoeirado microapartamento e pensava que precisava de um som melhor para ouvir Ella Frizgerald com qualidade; nisto pensou que Adorno deveria se foder, com sua posição em relação à música, principalmente ao jazz, que restringisse a teoria ao cinema, já que ele nutria grande simpatia pela critica da Escola de Frankfurt, só não queria perder mais tempo, desta vez sobre as conspirações acadêmicas.
            No tempo da utopia morusiana do seminário era fã inconteste de Leonardo Boff, hoje ao vê-lo apoiar o partido dos trabalhadores sem nenhuma razão “cósmica”, passou a achá-lo só mais um, assim como sua candidata o decepcionava ao se juntar aos velhos socialistas da segunda divisão. Em meio ao tiroteio, bem menos transcendental, mas também não muito calvinista como exposta por Weber, se deparando aos restos de excrementos indígenas das esquinas (ou será de mendigos?), num misto de repulsa social e orgânica ele tomava consciência de sua pequenez diante dos fatos, mas ainda assim num refluxo socrático se via melhor que todos àqueles que emitiam opiniões chulas na tevê logo cedo; um país de empirismos que lapida seus ícones sobre a miscigenação de soteropolitanos sem soterologias, uma de suas matérias preferidas e mais divergentes dentro da teologia.

_ Descubro que minha natureza é má até como artista, aqui sou falho e a arte só vai importar daqui para frente, fora da caverna.

            E assim saiu em busca de animais, agora talvez os deixassem viver e só iria copiá-los, plagiá-los, mimésis como no Kung Fú, estes animais já não se encontrariam em seu estomago, a não ser por fome fisiológica, queria escorpiões, já que o acaso destinado lhe empurrava para longe de qualquer filiação Estatal, o grande demônio fantasiado de Abraxas, com ele não funcionou, lhe destinaram o profetismo às avessas, que é aquele que luta contra dois, ou seja, contra todos.   

_ Prefiro esperar Godot que esperar o amor!

            A frase que retumbava sua mente. Já tinha comprado o livro, mas ainda não havia lido, e aquilo lhe fazia fumar, não conhecia mais quem pudesse lhe vender um baseado, então fumava o velho cigarro careta aguardando quem seria o próximo que cruzaria seu caminho com noticias de lá.
            Ligou para o senhor Rouanet e a telefonista responsável pela recepção atendeu, então o ex-seminarista deixou a mensagem fulminante:

_ Não me enviem mais suas cartas místicas de carisma, pois não desenvolverei projetos para imbecis julgarem e protocolarem no nome dos canonizados da tropicalidade e seus filhos e devotos eternos que desde já foram entronizados no além e nos anais da cultura celestial.

Diego Marcell

25-10-13

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