2.2.17

Crônica de um amanhecer que não quis esperar




            E se já amanhece quinta-feira, e a depressão em cinza minimalista é decalque na persiana. E se a festa é morta e não vale mais lembranças. E se o punk é só minha desgraça de faminto. E se a grande peça perdi no bueiro. E se silenciar é ter que aguentar ouvir motores. E se quero ainda uma semana a mais de férias e se não quero nunca voltar. E se nada continua a fazer sentido, hoje menos ainda o faz. E se gramática e cultura me restam apenas como overdose. E se a solidão for meu refúgio, meu encanto e minha lágrima, ou apenas um bolo com glacê e fios de ovos. E se meu mundo é apenas um sentir podado. E se o cheiro disso tudo é azedo e o gosto doce, tudo me enoja. E se sorrir virou laço em cabelo parco de bebê, adereço na indiferença. E se não tenho mais tempo, se quebrei os relógios, se as cervejas levam três horas pra congelar. E se os anos não fazem diferença, os calendários sem borracharias, as modelos sem fotógrafos, a tinta óleo sem imagem para vir-a-ser. E se as esquinas já não suportam pixo, sexo, mendigos, que dirá poesia. E se não houvesse mais coceira e se o pó fosse feito de baunilha. E se o sol não se precipitasse a ponto de ter validade como deus imperfeito. E se esculachar idiotas fosse uma prática esportiva como atirar nos patos em 8 bits. E se não precisássemos perguntar.

Diego Marcell
2/2/2017

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