4.3.16

Amizades, casamentos e rocamboles


            Bernardo e Jackson se conheceram num destes cursos técnicos do SESC, começaram a fazer trabalhos juntos e descobriram certa afinidade, ambos recém-casados resolveram fazer programas de casais, que basicamente se resumiam a jogos de cartas e cervejas meia-boca.
            Passados 15 anos de amizade séria sob a vida medíocre do proletariado tardio, até que um dia Jackson sofre um acidente de trabalho e torna-se um peso, para todos. Cintia sua mulher, se dedica ao marido inerte após seu horário de vendedora de móveis descartáveis; ela é uma pessoa boa, e sua criação luterana a sustentam em tais valores.
            Seus amigos Rita e Bernardo continuam a fazer visitas ao casal, porém a jogatina foi afetada, e o número de cervejas no mercado foi reduzido em 40%, já que era a custa do invalidado grande parte da festa alcoólica.
            Rita como o nome já diz, é devota de santa Rita e Bernardo como o nome já diz, de ninguém, após a catequese ele preferiu se dedicar ao Iron Maiden.
            Lá se vão cinco, seis anos e o homem na cama, responde com olhos feéricos as histórias do amigo, às vezes ambos ficam a sós, Cintia aproveita para viver nestas horas.
            Neste ano o aniversario do aposentado caiu numa data ruim, numa segunda-feira, num dia de chuva, nem frio, nem quente, num dia sufocante de gás carbônico e rotina, mas Bê pediu dispensa, disse que faria o turno da noite, pois iria hoje ver seu amigo, comprou-lhe um charuto e rumou ao bairro vizinho; ao chegar, Cintia o esperava ansiosa para ir ao mercado, à panificadora, ao boteco, comprar um bolo, um rocambole, um sonho de nada, enquanto os amigos fumavam e bebiam conhaque e relembravam... não havia nada a relembrar de suas vidinhas.
            Cintia mexia nas sacolas, fazia um café, Bernardo com 1/3 de charuto na boca ofereceu à amiga, ela puxou, cuspiu no tanque e se apoiou na pia para pegar uns pratos, ele secamente lhe pergunta:
_ E se nós transássemos?
_ O que?
_ Você tem feito sexo?
_ Não! É óbvio que não. (Indicando o quarto com os olhos).
Ele a pega pela cintura, beija seu pescoço, levanta sua saiam se apoiam na mesa, xícara cai, jarra cai, muito barulho, eles fodem, fodem, fodem como se estivessem numa realidade virtual que projetaria uma praia nunca habitada, fodem sobre a mesa e sobre o rocambole, fodem com o respeito de velhos amigos, pela velha amizade, fodem e gozam como nunca, enquanto isso, no quarto, Jackson espera o sonho de goiaba, ou talvez delire imaginando imperfeições etéreas de um deus obsoleto, corroído pela chama dos remédios, este em muito foi esquecido pelas orações da mãe pentecostal, enquanto Cintia e Bê comemoram sabe-se lá o quê, com um pobre café preto, ele delira com as curvas de Rita que ele teima em foder em segredo, com a densidade colérica de um pecador.

Diego Marcell

8/11/14

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