28.4.14

A desgraça estética


            Nosso mundo urbano, elétrico, tomado de signos e motivos forjados nos permite recorrer às futilidades, ao Belo, ao consumo de arte e seus gêneros mais atrativos nos muitos subgrupos sociais que se formam, a demanda a principio é espiritual quando as buscas de cultura perpassam não só, neste caso, a grande mídia, mas as buscas especificas no Google, no Youtube e similares, isto revela necessidades essenciais do ser humano, não atentarei aos problemas Freudianos, mas neste momento, tão somente com os objetos culturais, os fenômenos propriamente ditos.
            Essa necessidade de linguagem além da de comunicação objetiva, mas aquela que recorre à forma, as abstrações sempre em busca de um ponto extático onde a mente de nossa espécie possa habitar eternamente, permitir diante das burocracias de uma pólis, criar universidades, que segundo e seguindo as mudanças e aglomerações sociais também se alteraram muito desde a Academia de Platão, hoje segundo normas já arcaicas da modernidade temos nossas faculdades de artes, que nos cursos de licenciatura cumprem a necessidade dos currículos escolares, mas nos cursos de bacharelado se não destinado a poucos afortunados que poderão se dedicar pelo luxo, para onde estaremos enviando os artistas? À nossa sociedade que tanto necessita da arte, como já abordei até aqui? Bom, pelo menos era a isso que em tese se imaginava, mas infelizmente iremos esbarrar em um problema que afetará direta e profundamente esta máquina, um país como o nosso sofre de uma eterna crise onde o funcionamento deficiente desde o inicio nos relegou um capitalismo precário, como escreveu Oswald de Andrade num texto chamado “O sentido do interior”:

O homem inapto para trabalhar mas precisando trabalhar tropeça no caminho em que se empregou sem ter vocação, em que se comprometeu sem compromisso intimo. É o médico que detesta os seus agonizantes, o advogado que executa por detrás os seus próprios clientes, o engenheiro que se associa ao fornecedor para lucrar. Num mundo que perdeu suas coordenadas morais, isto é visível a olho nu. (...)
Mas que se deve fazer então? Abandonar o trabalho humano porque as suas fontes estão envenenadas? Nunca! Bastaria organizar uma sociedade onde cada um pudesse seguir a sua própria vocação, onde cada um tivesse a liberdade de se orientar, se educar e escolher. O trabalho assim exercido deixaria de ser uma condenação e um cansaço. Para que cada um se encontrasse no dever e se sentisse feliz cumprindo a tarefa social que elegeu. Nas sociedades algemadas isso é impossível porque não há saúde para todos, quanto mais educação para todos. O que há é fome e desgraça para a maioria. (ANDRADE. 1992, p. 194-195)

Ou seja, por maior e mais potente que seja este espírito da arte no ser humano, com fome e desgraça este jamais poderá consumir suas próprias produções e desejos, interrompendo assim a autogestão desta parte fundamental da biodiversidade sociocultural causando uma cadeia que só pode puxar para baixo e desencadear a depressão do sistema, com isto o Estado recorre a saídas emergentes para “salvar” aos olhos de todos o que sequer foi percebido pela massa, esta falta de percepção já é decorrência desta queda gerada pela cadeia negativa, estas “salvações” emergenciais não passam de mentira para a área, já que as leis de incentivo a cultura com suas formas de patrocínio acabam privilegiando artistas consagrados, reduzindo assim a cultura nacional a poucos nomes, se ao menos a lei fosse usada como lançamento de artistas inéditos, deixando àqueles que já passaram por isso a disposição popular do reconhecimento obtido a partir deste momento, mas não, ou as grandes empresas destinam seu imposto de renda em nomes que lhes darão retorno publicitário, ou o artista que se submete a editais menores precisa além de dedicar seu tempo a produção intelectual, precisa também de conhecimento técnico e burocrático mais próximo ao Direito, Administração, Contabilidade e Economia do que das áreas artísticas; forçando a maioria dos artistas a contratarem um especialista para criar seus projetos, o custo elevadíssimo cobrado para isto coloca em jogo novamente a cadeia negativa, já que o artista por não ter publico, consequentemente não tem dinheiro, desta forma não pode pagar para alguém fazer seu projeto, sem projeto sem lei, sem lei sem visibilidade, no ostracismo não existe produção artística, o que nos leva a um artista sem público e sem dinheiro fechando o ciclo de nulidade da área artística já que a sociedade a que pertence tal artista passa fome e vive na desgraça, inclusive o artista.

Nota:
ANDRADE, Oswald de. Estética e política. São Paulo: Globo, 1992.

Diego Marcell

26-04-14

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